sábado, 7 de março de 2015


A Culpa é das Estrelas


"Por ser um melodrama, é esperado que o romance apele para as emoções do público, partindo da identificação com as personagens. Mas ao contrário dos típicos “filmes para chorar”, que inventam sucessivos conflitos para tornar a história mais lacrimosa, este projeto anuncia desde o início a um  problema dos protagonistas: o cancro. Todos os conflitos serão decorrentes desta doença. Por isso, o projeto parece ser bastante honesto e menos manipulador do que a grande maioria das obras deste género.

Hazel e Gus são dois personagens fortes, maduros para a idade que têm, e repletos de perguntas profundas sobre a morte, a vida e o legado.
A Culpa é das Estrelas é uma das raras produções adaptadas de uma obra literária. O ritmo da narrativa é fluido, graças a uma edição discreta e eficiente. O roteiro faz a curiosa opção de ocultar todos os elementos alheios ao casal principal: não se sabe nada sobre a vida de Hazel na universidade, pouquíssimo sobre a vida dos pais ou dos amigos. O foco é nos dois, o tempo inteiro. Os protagonistas estão em cena em todas as imagens, algo que pode parecer redutor para descrever o ambiente ao redor, mas que permite um aprofundamento na personalidade de cada um. É uma aposta arriscada, mas que rende os seus frutos.

Os atores também são impressionantes. Se alguém ainda duvidava do talento de Woodley, neste projeto ela mostra do que é capaz apenas com o olhar e com poucos gestos. Elgort também está à vontade com as tiradas sarcásticas, compondo uma personagem interessante, preso entre a aparência forte e as inseguranças que esconde. Com a sintonia entre os atores, as cenas mais belas do filme acontecem em silêncio, quando os dois se comunicam muito claramente com o olhar – como no primeiro encontro no grupo de apoio. Por isso, o diretor Josh Boone opta por colar a câmera no rosto dos dois sempre que possível, evitando qualquer imagem que possa explorar a doença de ambos. Ou seja, Gus raramente é visto a caminhar e a mostrar a  sua perna mecânica, enquanto Hazel não revela os tubos que drenam os líquidos do seu pulmão. É uma maneira pudica, mas também respeitosa, de sugerir que aquelas personagens valem menos pelas suas patologias do que pelos seres humanos que são, e pelas emoções que sentem. Completando o bom elenco, Laura Dern tem um papel pequeno, mas afectuoso, e Willem Dafoe faz uma aparição amarga e potente.

Se alguém merece os parabéns neste conjunto, é o próprio diretor Josh Boone. Os diálogos e a narração certamente mereciam algo melhor do que os planos simplíssimos criados pelo cineasta. Boone tem uma maneira bastante interessante de filmar algumas cenas, como o jantar no restaurante holandês e o momento de intimidade entre Hazel e Gus, filmado com a câmera deslizando pelo corpo dos dois, a partir dos pés. Isso sem falar nas câmeras lentas no hospital, ou a imagem tremendo nos momentos de crise respiratória de Hazel. O cineasta tem pouca imaginação, adotando um padrão televisivo e publicitário – principalmente no segmento na Holanda, que adquire um inegável aspecto turístico.

Mesmo assim, A Culpa das Estrelas acaba por ser um projeto muito acima da média em comparação com os dramas normalmente oferecidos ao público adolescente. As personagens têm complexidade, conseguem alternar entre dúvidas típicas da juventude e questões mais profundas sobre o amor e a morte. Dentro do género “melodrama romântico”, Hollywood raramente consegue fazer algo melhor. Sem dúvida, o palavreado simples e direto de John Green para abordar o câncer contribui para atmosfera naturalista e comovente.

Uma frase que me veio à cabeça após o fim do filme: “Nós somos infinitos”. Esta não é uma frase do livro de Green, e sim do filme "As Vantagens de Ser Invisível", outro drama adolescente com o qual A Culpa é das Estrelas tem muito em comum. Ambos retratam a juventude de modo grave, mas afetuoso, enquanto refletem sobre a questão essencial da marca deixada por cada pessoa naqueles que a amam. Os dois filmes e livros exploram a bela metáfora do infinito para enfrentar o esquecimento, a passagem do tempo e o medo da morte.

                                                                                                                                                                              Luar

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